quinta-feira, novembro 30, 2006

Volver

Sinto a necessidade intrínseca de lá voltar como se disso dependesse a minha vida. Não há amor como o primeiro, o único local onde me senti em casa, talvez por isso cada vez que recordo aquela cidade o meu coração morto bate uma vez, duas vezes, mais do que as que consigo contar, contra o compasso da respiração ténue. Barcelona, sempre Barcelona... onde consegui sorrir à velocidade dos meus passos. Onde me senti em paz...


Barcelona, Março de 2005

Foto por Eye of Horus

P.S. Doi-me o corpo de tanto me doer a alma.

terça-feira, novembro 28, 2006

Quero entrar, quero ver o que esconde...


Foto por Eye Of Horus

quinta-feira, novembro 23, 2006

After dark(ness)

Foi na noite... É sempre na noite e lá fora chove...


Encolho o corpo o mais que posso para resistir ao meu mundo, que insiste em esbofetear-me mal o sol se põe. Consigo ouvi-lo ferver quando se afunda no mar sabias?! Naquele exacto momento em que o céu abre as portas à escuridão e o azul se desvanece, eu estou sempre lá, mesmo que ausente. Recolho esses segundos, com as mãos em concha, para soltar as memórias, deixá-las rodopiar à volta do corpo enquanto a carne se descola dos ossos, enquanto os joelhos se vergam, enquanto a cabeça se prosta bem colada ao peito e com a boca consigo engolir o coração. Em seguida aninho-me no chão, nunca é tão frio como o vento que me desenha a silhueta.
Lá atrás, nas minhas costas, jaz o sol, desfiam-se as palavras que escrevi na areia, aquelas que acreditei que permaneceriam faraonicamente. Sabes... mesmo quando o mar as engoliu em espuma, continuei a vê-las sulcadas na minha mão direita, a que ainda se ergue para me escudar o olhar.
À minha frente, quando as luzes se apagam, consigo ver recortes do mundo meu, branco, sem côr, gelado mas não tão frio como o que se faz sentir dentro de mim.
Ao fundo, no horizonte que me desce sobre os ombros, está a música que não se devia fazer ouvir, que me golpeia a pele, que me esventra toda e qualquer réstia de crença.
Se não te moveres, fechares os olhos e te esqueceres de ti consegues ouvi-la... Eu escuto-a na espera da chegada da manhã, mas fora do meu mundo a chuva continua a cair, enquanto na minha cama a dor me sussurra canções de embalar.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Da amizade e da saudade

Para a XAyiDe:

Chegaste numa manhã e não falaste. Voltaste numa outra manhã com os teus caracóis, negros-revoltos, adormecidos sobre os ombros e os teus passos sonantes no chão esmeralda baço do corredor escuro onde nos cruzámos tantas vezes. Vieram os dias e com eles chegaram os cafés amargos mexidos em dez minutos de conversa, os sorrisos de quem não se conhecia, as palavras-vírgula com que começámos a pontuar uma amizade que espreitava sentada no último degrau das escadas de alcatifa preta. Depois começámos a falar nas noites que estendíamos pela madrugada e escrevemos, nas horas que estavam por vir, os parágrafos dos teus sorrisos, das minhas lágrimas, da tua impressionante força de viver.
A tua vida saltou, revirou.
Um dia trouxeste uma rosa vermelha amarrada ao teu pescoço, lembro-me que vinhas feliz. Mais tarde, os teus caracóis encolheram-se a medo e os teus sorrisos nasceram tristes. Fiquei ali, paralela, com a palma das mãos livres para quando sentisses que precisavas de as agarrar.
O tempo passou. Chegou o doce, trouxe o amargo e o tempo passou e voltou a passar e trouxe o agridoce, porque cada um tempera a vida como lhe convém ou como melhor sabe.
Hoje, aqui, nesta terra, o horizonte está sépia e nas manhãs já não se mexem cafés em dez minutos de palavras-laços, mas tu já não estás aqui.
Agora as ruas que sulcas são íngremes e o local que te acolhe é imponente, defende-se nas colinas e sol espalha-se no rio, misturando o dourado no azul das águas profundas. Eu ouço-te daí, da cidade onde escreves o palpitar do mundo e emprestas a tua voz à realidade.
Vives lá, voltas quando o coração te pede e entras de rompante sempre com um sorriso nos lábios e eu, e nós, esperamos-te a sorrir para matarmos a saudade no tempo e ver mais uma vez que o teu sorriso voltou a nascer feliz.

terça-feira, novembro 14, 2006

Deixa-me falar-te das trevas... Encosto os meus lábios suavemente ao teu ouvido e derramo a minha dor no caminho que o hálito quente percorre na tua nuca.
Ouve a palavra que se rasga enquanto te roubo um último respirar.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Porque os anjos também caem

Ontem anoiteceu em mim... o corpo esquecido no azul, as mãos trémulas na penumbra, uma única luz guia, pequena, ténue, desfalecendo no branco. O corpo enroscado sobre o centro, os gritos pintados nas paredes brancas, o cheiro analgésico da meditação chicoteando o cérebro.
As I draw up my breath,
And silver fills my eyes.
I kiss her still,
For she will never rise.

Fora do ninho a luz queima, avança sobre o mármore quadrado e os meus pés descalços dançam em frio antes daquele momento em que a mão se fecha guardando o dez de copas do demónio feito mulher.

On my weak body,
Lays her dying hand.
Through those meadows of Heaven,
Where we ran.
Ergue a mão fechada e agarra a sobrevivência, pois rastejar é tão natural como o caminhares com o corpo hirto, sendo a única diferença a ocultação do olhar ferido aos corpos que se cruzam contigo e não olham para trás. Une-te à terra pois sempre foi tua mãe, dela emergiste invertida e nela mergulharás como um deus descrente.

Like a thief in the night,
The wind blows so light.
It wars with my tears,
That won't dry for many years.
Deita o demónio de copas na palma direita e sufoca-o com a esquerda, pressiona o sangue guardado atrás das linhas da vida misturando-o com as palavras e ouve, escuta agora as palavras que afogarás:
"Poderias ver-te dentro de mim sem que o oxigénio fosse preciso em jeito de manutenção do teu olhar. Sabes... eu poderia (vi)ver dentro de ti, sem que o sangue corresse célere como a água que escorre dos céus antes destes se rasgarem.
Poderíamos (vi)ver a morte mais do que alguma vez significaria a vida, no entanto, quando te clamei que morresses fizeste-o para mim e não por mim.
Esquece... e apaga os nossos nomes da rua."

"Loves golden arrow
At her should have fled,
And not Deaths ebon dart
To strike her dead."
Citações de "For My Fallen Angel" - My Dying Bride

terça-feira, novembro 07, 2006

Wake up of an induced coma

A cada camada da pele recortam-se as palavras que o olhar não decifrou e o meu nome assemelha-se ao início de um feitiço impulsionador do caos desejado.
Não se vê.
Não se ouve.
As palavras sibilam-se em hálito quente, gutural, para dentro do corpo que se sabe no caminho para nenhures. Esquecem-se no vazio porque são disso matéria, são estudo guardado em compêndios acamados no pó.

Breathing-trying to-breathing-stop-trying to-give it up-enough-breathing-trying to- alive-stop-surviving-breathing again-and-more-not-enough breathing-and-more-more-always-endless


Venha o fogo e queime as palavras em relevo, pois o pior cego é aquele a quem falta a visão da alma.
Venham as chamas e varram o corpo definhado e varram as palavras proféticas e varram as lágrimas diluvianas sobre a pele podre e varram a lembrança disforme nas pontas dos cabelos e varram de uma só vez o que não existe.
Que no fim nada fique.
Que no fim não reste o pó.
Que no fim permaneça o invisível.
Que o fim seja por si só aquilo que é.
"Ask yourselves, all of you...
What power would Hell have if those here imprisoned were not able to dream of Heaven?"
Neil Gaiman, The Sandman-Preludes Nocturnes