Caracóis de prata
Minha doce avó, minha eterna dívida de amor...
O tempo já mudou minha querida e dizem que o ano vai ser perfeito. Mas tu não estás cá para ver...
Este ano, que findou, não te escrevi no aniversário da tua viagem, perdoa mas simplesmente não conseguia ver para além do meu corpo cortado, alinhado com o coração estilhaçado. O meu coração partiu-se no dia em que em que te foste... Perdoa não te ter passado a mão pela face envidraçada, mas estava escondida no meio das árvores, tentando colar os pedaços o melhor possível, esperando que os rasgos na pele se unissem de modo a que não se vissem as linhas tortas da falta de ti.
Sei que me viste avó, senti a tua mão puxar-me para ti, muito devagar para que não me assustasse, como se faz a um animal magoado que procura um canto escuro para lamber as feridas.
A dor era tanta minha querida que a alma rasgou-se e o mundo parou para ouvir o meu dilacerar, mas eu fiz o melhor que podia e sabia,tu sabes que sim!
Este ano, que findou, não te escrevi no aniversário da tua viagem, perdoa mas simplesmente não conseguia ver para além do meu corpo cortado, alinhado com o coração estilhaçado. O meu coração partiu-se no dia em que em que te foste... Perdoa não te ter passado a mão pela face envidraçada, mas estava escondida no meio das árvores, tentando colar os pedaços o melhor possível, esperando que os rasgos na pele se unissem de modo a que não se vissem as linhas tortas da falta de ti.
Sei que me viste avó, senti a tua mão puxar-me para ti, muito devagar para que não me assustasse, como se faz a um animal magoado que procura um canto escuro para lamber as feridas.
A dor era tanta minha querida que a alma rasgou-se e o mundo parou para ouvir o meu dilacerar, mas eu fiz o melhor que podia e sabia,tu sabes que sim!
Continuas aí...
Sinto-te aí...
Hoje e sempre paralela a mim, abraçando-me ainda que longe, como fazias quando eu corria para te saltar para o colo, para me encostar ao teu ventre quente.
Sabes, passado tanto tempo, ainda consigo ouvir o teu caminhar acelerado e se fechar os olhos com muita força, vejo-te os caracóis prateados que eu insistia em desalinhar pelo simples prazer de neles mergulhar os meus dedos. Ralhavas comigo porque eu te deixava completamente despenteada e eu ria que nem uma tola e dizia-te sempre que assim ficavas mais na moda. Sabia que sempre que o fazia tu adivinhavas o que eu queria... Parece que te estou a ouvir, "Meu diabrete, meu único amor! Senta-te bem quietinha para a avó te pentear!" e eu fingia sempre que ficava contrariada por ter que me sentar durante tempos infindos, enquanto tu me escovavas o cabelo vezes sem conta até que brilhasse mais do que uma estrela cadente. Adorava cada minuto em que a escova descia e fechava os olhos quando me beijavas a testa no final.
Na manhã em que te foste amarrei o cabelo o melhor que pude, mantive-o assim nas horas-semanas que se seguiram, tão intermináveis. Recordo-me que a mamã entrou no meu quarto, os olhos dela fixaram-se no cabelo preso, agrilhoado à minha nuca e o semblante fechou-se ainda mais. Não conseguimos trocar uma única palavra, um único abraço.
Numa outra noite, ainda nas horas doridas, em que soltava o cabelo antes de me deitar a mamã entrou no meu quarto, trazia a minha escova na mão, aquela, a grande. Sentou-se na minha cama e puxou-me em silêncio para ela. No segundo seguinte os dentes da escova começaram a abrir caminho por cada fio castanho até às minhas costas, num compasso cirúrgico com as lágrimas e aí a mamã parou. Quando me voltei para a abraçar, ela olhava para a escova como se esta fosse detentora da única resposta que ela queria ouvir naquele momento.
Desde essa noite a tua filha não me penteou mais e eu, a filha da tua filha, continuo a pegar na escova em jeito de ritual, como se a cada deslizar tu voltasses para mim. Mas tu nunca voltas e eu continuo a pentear-me só, porque nunca mais ninguém teve a coragem de mergulhar os dedos nos meus cabelos...
P.S. Devia-te as palavras que não me cobras. Devo-te as visitas em que não me vês, porque me doi passar a mão na tua cama gelada. No entanto, trago-te um sorriso novo, em paz. De mim para ti.
8 Comments:
Tens um coração imenso, Eye, e eu orgulho-me muito da nossa amizade.
Continua a insistir nas palavras: elas escondem segredos e revelações, são o espaço do encontro.
Beijo fantasmagótico,
S.
Leio as tuas palavras, as primeiras do ano e tremo.
Tremo só de pensar no que aí vem, na dor que trazes ainda nos teus cabelos, nas dúvidas que levamos sempre connosco... viver todos os dias assim, cansa realmente...
Por meio de tudo, de todos e de todo o cansaço que trago hoje comigo, deixo-te um beijo imenso.
Fazes-me tanta falta.... minha querida....
Mil beijos
Olá!
Vim-te desejar um feliz 2007. (a "dor" fica para outra altura...)
bj
São as recordações que As fazem viver para sempre.
Fica a saudade, alguma tristeza... Mas deixa a dor ir embora. Por ti. Por ela.
Lindíssimo. Eu conheço esse tipo de amor, que é tão sublime, tão deinteressado...
PS: Vejo que os nossos gostos musicais são mesmo muito parecidos.
A ausência de alguém que nos e querido torna-se pesada a medida que vamos compreendendo o que essa pessoa era para nos; o que perdemos sem pudermos um dia recuperar... mas é por isso mesmo que a vida nos traz os amigos, os amores, as coisas boas e as más... para que não nos afoguemos na nossa tristeza e possamos (sobre)viver sem aqueles que nos são essenciais!
Fico feliz por te ter conhecido a cada dia! Tu e a Bela são pessoas que me conseguem, ás vezes sem uma palavra, fazer sentir melhor em mim mesmo.
Bj,
C.F.
bjinhos e bom ano de 2007 ;)
até breve!
BEM! Fogo... Escreves de 1 maneira!
Enviar um comentário
<< Home