quarta-feira, maio 31, 2006
segunda-feira, maio 29, 2006
Let the games begin III
"Your poison running through my veins(...)" - Alice Cooper
Aqui o tempo não se move impossibilitando que as memórias sejam riscadas.
Lá fora, na noite, o vento revolve a terra, as folhas agitam-se para a libertação doce dos ramos secos e uiva-se sob o luar.
Na minha janela o nevoeiro do cigarro e a visão de horas vividas à escassos minutos.
Cá dentro, no casulo, os olhos bem abertos na insónia, a tua voz ouvida vezes sem conta, o meu corpo guardando espaço para escrever-nos na vida.
P.S. O tempo que passamos juntos nunca me basta...
sexta-feira, maio 19, 2006
A albina
Continua a assolar-me o sono (pouco), viscosa e rápida.
Sempre foi assim, pelo menos desde que me lembro das noites irrequietas, o sentir inexistente debaixo dos meus lençóis, as pernas encolhidas bem junto ao peito para que a planta dos pés não lhe toque.
Na cama somos três. Eu-fetal, o medo imenso e ela senhora resfatelada apoderando-se do meu espaço, as escamas movimentando-se em busca do meu calor e a língua sonora dedilhando o meu medo.
No entanto não consigo desviar o olhar, que encarcero nas pálpebras fechadas, do branco alvo com que se veste e dos movimentos estomacais com que me seduz. Fico assim bem estática e fascinada, como qualquer presa que se preze em deixar-se degustar esplendorosamente.
É assim desde que me recordo do meu eu-pequenino que acordava aos berros e a minha mãe irrompia no meu quarto, para rapidamente puxar os lençóis para o chão e dizer: "Não está cá nada amor!"
É assim agora e sempre porque, mesmo não estando, sulcou a minha cama com a sua forma e eu sinto-a ali, adormecida, enquanto aguarda que lhe peça para me abraçar derradeiramente.
terça-feira, maio 16, 2006
Baú I
"Este ano parti o elo da corrente que há muito vinha sendo elaborado na minha vida.
Este ano não te escrevi no meu aniversário, nem antes, nem depois. Faço-o muito tempo após para mais uma vez te dizer que a infelicidade é uma constante, a companheira que nunca me largou a mão ao longo de toda a vida.
Não sei o que sinto, não sei onde estou.
Não sei que dia é hoje, não sei que horas são, não sei quem sou.
Descida vertiginosa da euforia para a tristeza, corrida apocalíptica para o inverso. Isto sou eu.
Perante ti, perante mim, em frente de todos os que me conhecem e a assumir perante o universo... eu sinto falta de amor. Quero ser amada por quem escolho amar ou será por quem não escolho? Como me posso esquivar a uma situação que se mostra à minha pessoa para gritar: tu és parte constante, presente e imutável!?
A sensação de que estou a ser julgada por todos os tribunais existentes nos reinos superior e inferior, desnuda-se perante os meus olhos.
O grito « Daqui ninguém sai vivo!» chegou tarde de mais.
26/12/2003
03h40m
P.S. É uma hora tão boa, como outra qualquer, para se esperar por um sinal de ti."
Ontem depois de ter perdido duas lágrimas numa mesa de café, senti saudades de vasculhar o baú que me acompanha desde os doze anos e no qual evito mexer. Tem demasiadas pessoas lá dentro.
Quando encontrei esta carta, lembrei-me imediatamente do seu conteúdo e desta vez não evitei chorar.
Amiga, lembro-me do dia em que começaste a entregar-me cartas que não eram para mim, dizias que ele não te amava e por isso não lhas entregavas. Recordo-me de dizeres que ficavam mais bem guardadas comigo e que seriam a prova de que um dia tu soubeste chorar sem mágoa. Agora, alguns anos depois em que nunca mais soube nada de ti, continuo a guardar-te as cartas e a perguntar-me por onde andarás tu?
Tu que te perdeste na procura da eventualidade de te encontrares... Espero que tenhas conseguido.
segunda-feira, maio 15, 2006
quarta-feira, maio 10, 2006
O olhar de Sísifo
Foto por Eye of horus
O vazio tornou-se num aríete insistente no meio dos seios. A pele, já translúcida, começa a ceder e tornar-se-á mais simples mergulhar as mãos para arrancar o pouco que ainda borbulha na mistura azeda de lágrimas, pó e gelo.
Chegou a hora de descansar no meio de quem escolheu uma cama de pedra laminada, velada por guardiães de um festim visceral. Guardiães de asas desfeitas, arqueadas por antigas trajectórias de vôos incrédulos, encerrados no livro dos esquecidos.
Rezam as páginas, escritas por um puritano de alma sangrada, os nomes de quem inocentemente optou por adormecer em prol da verdade. A dor eterna que recebe o corpo sem questionar.
Em cada agonia excruciante um sorriso de agradecimento e mais uma vez o olhar protector dos guardiães para que nada perturbe um ritual tão solene. Velam em silêncio, sussurram movimentos de protecção e impedem a entrada aos conspurcados do quotidiano.
Aqui não há ligação entre mundos e pulsos unidos em servidão. As cordas que amarram não são visíveis nos braços desfeitos e as lágrimas em catadupa não lavam o sangue negro que escorre dos olhos secos. Não é o branco que é sinal de pureza mas sim o rubro, sangue de quem dá o passo da libertação perante o fel que coroa a alma.
O guardião de alma sangrada fecha o livro e pousa a garra com que escreve. Vejo-lhe o olhar de quem sabe que o sono é merecido, a sua pouca força faz-me sentar e assim sendo, não o questiono enquanto me coloca uma das asas sobre o ombro agrilhoado.
Na minha mão direita a garra.
Os esquecidos serão, agora, escritos por mim.
Escrito ao som de "Locus Horrendus-The Night Cries Of A Sullen Soul..." de Desire
terça-feira, maio 09, 2006
Qual é o significado?
As palavras serão o meu fim no início que não é permitido, que é amassado nas tuas mãos de menino e das quais apenas relembro o som.
Hoje quando me ergui a tua face estava lá, de novo, mas desta vez não te consegui ver tão presente. O vapor colou-se no espelho e eu passei a palma da mão, a esquerda, aquela em que a asa morta do dragão asfixia, e a tua face estava lá, mais uma vez.
Tive que esbofetear-me. Não era a tua face, era a lembrança opaca das esperanças que depositei nas palavras por ti buriladas. Por elas enviei os sonhos para serem vividos numa única noite. A noite em que tu não vieste e me fizeste sentir tão pequena e só, acima de tudo só. Em quanto tempo se irá medir o ostracismo? Dias? Vidas? Sobrevivência... sempre em sobrevivência.
Em cada passo uma veia rasgada, a cada noite a promessa é apertada mais uma vez.
Consegues ver o meu olhar a arder?
My eyes shed tears
When I recall the saddest moment
Which filled me with sorrow
When I watched you going away...
Gone with the wind... Going away...
You parted, no word spoken
Without a tender beckoning
You left me sore
Handed over to grief's embrace...
My heart... My frozen heart
Is bleeding and crying
With our torn apart
You took in your hand
The autumn's tear
Spilt on the emotion
You caused by forsaking me
You were the last scrap of life
Within my being
You tore up an eternal wound
You left me dying...
And I told you...
That I felt this love was killing me
And pain was tearing me apart...
Forever I will long for you
In my silence... Silence... In my solitude... Solitude...
My silence... My solitude...
I will never forget that look of yours
Pierced through my heart...
Torn Apart - Desire
segunda-feira, maio 08, 2006
Let the games begin II
"no papel, as palavras escondidas, as nuvens.
dizes não posso ser o mundo hoje, esqueces que
tu és o mundo. dizes não posso, e eu gostava que
soubesses sempre que um lamento dentro de mim
te repete. abro o papel dobrado e abro a noite
no céu. as árvores são distantes, as palavras
e talvez a música, a terra é distante no
papel dobrado que me entregas escondido
na mão."
José Luís Peixoto in A Criança Em Ruínas
Arena limpa e alisada.
Armadura despida e mãos nuas.
Silêncio quebrado em mil pedacinhos.
Portas faraónicas.
A vida apostada na roleta parada, que espera o bater das asas da borboleta.
Escuta! Terramoto?! Ainda não.
Aguardemos pelo momento crucial, em que a luz corta o escuro quando a porta se abre.
Espero-te pelo tempo limitado a milhares de existências ou então deixa-me afogar em ti. Sempre em ti... mesmo quando não estás.
Armadura despida e mãos nuas.
Silêncio quebrado em mil pedacinhos.
Portas faraónicas.
A vida apostada na roleta parada, que espera o bater das asas da borboleta.
Escuta! Terramoto?! Ainda não.
Aguardemos pelo momento crucial, em que a luz corta o escuro quando a porta se abre.
Espero-te pelo tempo limitado a milhares de existências ou então deixa-me afogar em ti. Sempre em ti... mesmo quando não estás.
quarta-feira, maio 03, 2006
Deixa-me entrançar o cabelo. Eu deixo que o enroles no meu pescoço, apertando mais e mais. Não te esqueças de asfixiar-me, assim, suavemente.
É que hoje apetece-me morrer... lentamente.
terça-feira, maio 02, 2006
segunda-feira, maio 01, 2006
Puzzle mental no escuro
Não existe tempo que se possa contabilizar nos anéis negros que envolvem a profundeza do olhar de quem quer fugir. A presa apressada, esquiva, sufocada nas pessoas envolvidas nas palavras. De novo insistes, sem saber, na confusão mental da noite em que todos os caminhos desembocam no peito negro. Agora páro e não era isto que queria escrever, mas também não sei quais as palavras cruciais de um eu inebriado. Porque as palavras valem o que valem, não se trocam por corpos esquecidos na décima segunda badalada e o peito, aberto, continua negro. O grito, negro, vindo do peito, aberto, lança chamas impelindo para o rio que corre mais rápido do que a velocidade galopante a que as folhas escritas se rasgam.
No cimo do negro, do peito, a coroa com duas esmeraldas, quase como grandes olhos esfomeados mas cegos na multidão.
Por esta vez, a marca na nuca não imperou e tu conseguiste ver o que eu não vi... mas só por esta vez.